Você já parou para pensar como nosso organismo consegue manter um ambiente interno estável e relativamente constante apesar de tantas influências externas, ambientais e mutações genéticas agindo sobre ele?
- A resposta para essa pergunta é o Sistema Endocanabinoide (ESC). .
Nesse artigo vamos te explicar detalhadamente sobre como ele funciona.
Esse sistema é conhecido como neuromodulador (atua na regulação da área neuronal) e foi descoberto no final dos anos 80 e início dos anos 90. Apesar de recente, conta-se que desempenha funções importantes no sistema nervoso central, na plasticidade das sinapses e na resposta a insultos endógenos e fatores ambientais. Ele consegue manter o organismo em homeostase, ou seja, preserva condições ideais para as nossas células realizarem suas funções buscando o equilíbrio.
E isso quer dizer que o ESC é encontrado em praticamente todos os sistemas do organismo, regulando uma série de processos básicos no corpo, como por exemplos:
- Temperatura, pH, memória, aprendizado, apetite, até mesmo a pressão arterial, entre tantas outras funções de locais que tenderão sempre a homeostase.
Do que é composto esse sistema:
- Receptores de canabinoides;
- Canabinoides endógenos (endocanabinoides);
- Enzimas que sintetizam e degradam os endocanabinoides.
Os receptores canabinoides
Eles são encontrados nas superfícies das células e ao receberem informações da parte externa, sinalizam para o interior celular em busca de uma resposta para aquele sinal.
Existem 2 tipos de receptores canabinoides:
- CB1 e o CB2, não são os únicos, porém, foram e são os mais estudados até o momento.
Sabe-se que os receptores CB1 são os mais encontrados no organismo. Ele é formado por 472 aminoácidos (moléculas orgânicas capazes de formas proteínas) em humanos, predominando no cérebro, musculo esquelético, fígado e nas ilhotas pancreáticas. Já o CB2 é composto por 360 aminoácidos e pode ser encontrado nos testículos, em níveis mais baixos nas regiões de recompensa do cérebro, no baço e no sistema imunológico.
Quando se fala em cérebro, para se ter mais precisão, os receptores CB1 são abundantes no sistema nervoso central (SNC), principalmente no cerebelo, no córtex, gânglios da base e no hipocampo.
Os CB2 são expressos em baixos níveis no SNC quando comparados com CB1. Parece que, o mesmo pode ser expresso em condições patológicas, como, por exemplo, em lesão de nervos, podendo ser induzível, com expressão aumentada em até 100x após lesões ou durante a inflamação.
Tanto a ativação de CB1 quando a de CB2 exerce diversas funções na fisiologia da célula, incluindo motilidade celular (capacidade das células se moverem), transcrição gênica (processo no qual um gene da sequência de DNA é copiado), função sináptica (conexão entre duas células nervosas)…
Os canabinoides endógenos
São lipídios endógenos produzidos pelo próprio corpo humano. Eles envolvem os receptores canabinoides e seus precursores estão presentes nas membranas lipídicas das células. São chamados assim, pois suas estruturas são parecidades à dos canabinoide, extraídos da planta Cannabis.
Os primeiros a serem descobertos foram a anandamida (araquidonoil etanolamida) e o 2-araquidonoil glicerol (2-AG), que são produzidos e usados quando há necessidade no organismo.
A eficácia dos canabinoides varia dependendo do tipo. Por exemplo, o 2-AG é capaz de se ligar com alta eficácia nos receptores CB1 e CB2, já a anandamida se liga com baixa eficácia no CB1 e muito baixa eficácia em CB2.
O ácido araquidônico (um ácido graxo, sendo umcomponente importante das membranas celulares) está presente tanto na anandamida quanto no 2-AG, mas a maneira como são produzidos e degradados no corpo é diferente, sendo controlados por diferentes enzimas.
É importante notar que o 2-AG não apenas atua como um mensageiro natural nos receptores de canabinoides, mas também fornece ácido araquidônico para a síntese de prostaglandinas (compostos lipídicos), que ajudam a controlar processos inflamatórios, fluxo sanguíneo e coagulação em situações como lesões teciduais ou infecções.
E de onde surgiu “anandamida”?
O pai da Cannabis, conhecido como Raphael Mechoulam, e os seus auxiliares, por volta dos anos 90, após já ter isolado os primeiros fitocanabinoides (compostos derivados da cannabis), descobriu a existência da Anandamida, que é derivada da palavra “ananda” e significa alegria, felicidade e êxtase; já no meio científico pode ser chamada de N-araquidonoiletanolamina (AEA), um neurotransmissor, que é um mensageiro químico do cérebro.
Após isso, descobriu-se a existência dos receptores canabinoides, CB1 e CB2 nos seres humanos e então os cientistas chamaram essas substâncias de endocanabinoides.
As enzimas
A terceira parte desse sistema é composta pelas enzimas metabólicas, que possuem a função de “destruir” os endocanabinoides após serem usados. Garantido que cumpram sua ação durante o tempo previsto. As catalisadoras desse processo são as FAAH e MAGL, que degradam a anandamida e o 2-AG, respectivamente.
Quando ocorre alguma perturbação em nosso corpo levando ao desequilíbrio, esse sistema é acionado em busca do reestabelecimento do equilíbrio, ou seja, ele é pró-homeostático, ativado de forma temporária para restaurar e trazer a zona fisiologia de volta ao funcionamento do organismo.
E qual a relação desse sistema com a Cannabis?
Como vimos acima, o nosso organismo tem conhecimento e infraestrutura para fabricar seus próprios canabinoides e interagir com o ESC, o mesmo pode acontecer com fitocanabinoides exógenos, extraídos da Cannabis.
Apesar da cannabis possuir mais de 140 fitocanabioides, o Canabidiol (CBD) e o Tetrahidrocanabinol (THC) são os mais encontrados e estudados até o momento.
O THC, encontrado na Cannabis, tem efeitos fisiológicos e farmacológicos ao interagir com os receptores do sistema endocanabinóide. Ele se liga aos receptores CB1 e CB2, influenciando processos como sedação, alívio da dor, mudanças no pensamento, memória, coordenação, percepção do tempo e prazer, além de desempenhar um papel nos processos inflamatórios e imunológicos. Adicionalmente, estimula a liberação de dopamina, neurotransmissor ligado à motivação, controle motor e formação de memória.
Já o CBD, têm baixa afinidade de ligação para esses receptores endógenos e, em vez disso, atua fora do sistema endocanabinóide.
Na literatura há vários estudos, mostrando que o CBD, apesar de não ter ação psicotrópica, possui o potencial terapêutico para ajudar no tratamento de doenças neurológicas, como, por exemplo, no Transtorno do Estresse Pós-Traumático, doença de Parkinson e Huntington, esclerose múltipla, epilepsia, ansiedade, na recuperação de fadigas e dores crônicas. Acredita-se que possa ser através da inibição da degradação da anandamida ou pelas suas próprias atividades antioxidantes.
Se você está em busca de conhecer mais sobre o mundo da Cannabis e suas possibilidades terapêuticas, continue acessando o site e fique ligado nas publicações.